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Foto do escritorAlex Stein

Vidas Roubadas




Essa semana começou com o caso de uma criança de 11 anos, grávida de 22 semanas em decorrência de um estupro, que teve o seu direito legal ao aborto violado por uma juíza. Fato que reacendeu novamente a discussão sobre um tema extremamente delicado na maioria das sociedades que possuem forte presença religiosa no seu ordenamento jurídico.


Mas antes de começarmos a discutir o assunto, convido você a escutar essa música, enquanto vamos papeando, e já adianto que esse artigo possui o intuito de apenas trazer informações sobre o tema, e não de condenar, ou justificar quem quer que seja.


--- Pausa para a música iniciar ---


Você sabia que, OFICIALMENTE, dados de 2019 indicam que há, em média, 1 estupro a cada 8 minutos no Brasil?


Isso significa que ocorrem 65.700 estupros todos os anos, dos quais 57,9% dos casos são contra crianças e jovens de até 13 anos de idade. Ou seja, 38.040 crianças... Um pouco mais do que toda a população da cidade de Gramado, no Rio Grande do Sul.


Esses dados não condizem com a realidade, já que a quantidade de casos não reportados é muito grande no nosso país (mais, aqui).


A lei brasileira permite o aborto a qualquer momento da gravidez, e sem a necessidade de autorização judicial, em 3 casos: Estupro, Risco de vida à mãe, e Anencefalia do feto.


Embora haja uma norma técnica do Ministério da Saúde, afirmando que a interrupção da gestação deve ser feita até a 22ª semana de gestação, tal norma possui um caráter de recomendação, já que a lei penal se sobrepõe a ela.


Ou seja. O caso da menina de SC que foi proibida de realizar o aborto não encontra respaldo legal algum no ordenamento jurídico nacional, e vítimas de violações de agentes do Estado brasileiro, como este que ocorreu, acabam sofrendo duas vezes: Pelo agressor e pelo próprio Estado, que deveria proteger a vítima.


Aliás, está situação está longe de ser novidade no país nos últimos anos.


Em agosto de 2020, a família de uma menina de Pernambuco também foi pressionada a não se submeter ao aborto legal. Naquele caso, por dois médicos.


Além disso, religiosos protestaram contra a interrupção da gravidez e tentaram invadir o hospital, depois que uma ex-assessora da ministra da Mulher e da Família publicou na internet o nome da vítima e o local da maternidade onde ela seria atendida, violando o Estatuto da Criança e do Adolescente (mais, aqui e aqui).


Em 2009, também em Pernambuco, a Arquidiocese de Olinda e Recife chegou a ameaçar fazer uma denúncia ao MP de Pernambuco contra um possível “assassinato” de duas crianças, após saber que a mãe havia permitido o procedimento do estupro legal em sua filha de 9 anos, grávida do padrasto estuprador.


Para a arquidiocese, o que prevalece é a lei de Deus, que diz “não matarás” (mais, nessa reportagem).



E aqui eu chego ao ponto 1: Em que tipo de Estado queremos viver?


Um, onde os dogmas de uma religião prevalecem nas suas leis, como no Afeganistão, por exemplo?


Se sim, qual a religião que deve prevalecer? A minha, a sua, ou a de terceiros?


Qual delas está certa?


O ponto é que, qualquer religião que for escolhida não irá acolher a todos, motivo pelo qual o Estado DEVE ser laico.



Por fim, eu chego ao meu ponto 2: As leis sobre o aborto no Brasil são frutos de uma construção fundamentada em moral religiosa, masculina, ou na saúde (física/psicológica) da mulher?


Quem tem direito sobre o corpo que carrega um feto?


Eu sempre penso que, se o homem também engravidasse, o aborto jamais seria considerado crime (o que não significa que todos os homens sejam machistas).


Mas como a construção do mundo sempre foi pautada através da visão masculina, o mundo é como é.


Nesse mundo, grávidas com possibilidades monetárias que querem abortar podem sair do país e realizar o procedimento em países ocidentais, ou outros onde o aborto é legalizado.


Aquelas que não possuem condições financeiras acabam realizando o procedimento em clínicas clandestinas (quando não abortam de formas inimagináveis e sub-humanas).


Para você ter ideia, no primeiro semestre de 2020, o SUS fez mais de 80 mil procedimentos após abortos malsucedidos, frente a pouco mais de mil interrupções de gravidez previstas em lei (mais, aqui).


E a esmagadora maioria das complicações ocorrem em mulheres de baixa renda.


Foram 195 mil internações em 2019, ou 535 internações por abortos mal-sucedidos, induzidos, ou espontâneos... TODOS OS DIAS daquele ano, só no Brasil (mais, aqui).


Talvez você possa estar pensando “Mas, quem não quer não faz filho” (confesso que escuto muito isso).


Se esse é o seu caso, convido você a ir comigo em uma das inúmeras comunidades de baixíssima renda que eu conheço Brasil afora, onde meninas sequer têm condições de arcar com absorventes femininos, quiçá com métodos contraceptivos.


Isso sem contar a questão cultural, onde o aconselhamento e empoderamento feminino são coisas de outro mundo (submetendo mulheres a relações sexuais sem camisinha).


Como eu disse anteriormente, só quem possui condições pode sair do país para praticar o aborto (mais, aqui, aqui, aqui e aqui).


A questão aqui, neste artigo, não está em ser contra, ou a favor dele, embora eu aconselhe assistir o filme “O Segredo de Vera Drake”, assim como ler esse texto, e esse relatório).


A questão está na implementação de uma sociedade que possibilite bem-estar a TODAS as pessoas.


E quando eu falo em bem-estar, eu falo em moradia, alimentação, vestuário, educação, segurança, saúde, lazer... Capacitação de Ser Humano... com Dignidade e Qualidade.


Tenho certeza de que o número de abortos (legais e ilegais) cairá proporcionalmente ao aumento de bem-estar social para todas as pessoas da nossa sociedade.


É por isso que, independente de você ser contra, ou a favor do aborto, eu convido você a EXIGIR este bem-estar do nosso Estado a TODAS as pessoas, em prol de uma sociedade onde TODOS nós possamos Ser Humanos.


E é justamente na construção dessa sociedade, que a Civisporã elabora o seu trabalho, seja na publicação de conhecimento nos seus canais, seja produzindo camisetas para nós, seres humanos, e nossos amigos peludos.


Sempre com o propósito de sensibilizar a população de que a sociedade atual é o resultado daquilo que somos no dia a dia, e de que nossas atitudes transformam a sociedade, positiva – ou negativamente.



Alguns dos artigos apresentados aqui no Sermoré da Civisporã, ou nos textos estampados nas suas camisetas, podem parecer um pouco duros, pois repreendem atitudes prejudiciais; outros apresentam um convite a juntar “lé com cré”; outros são motivacionais.


Mas todos eles nos fazem pensar e possuem o mesmo objetivo: lembrar que somos nós que construímos o Brasil e que cabe a nós melhorar a nossa sociedade. Sociedade esta que se iniciou no encontro dos colonizadores portugueses com os nativos indígenas que aqui já viviam.


E é refletindo esse início do nosso país que está estampado o propósito fundamental da CIVISPORÃ:

CIVIS: Sociedade, em Latim.

PORÃ: Boa/m, bonita/o, melhor, em Tupi.

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